"À beira dos rios dos sertões ... penduramos nossos violões" (Salmo 137)

À guisa de saudação natalina, quero compartilhar com vocês alguns pensamentos que povoam minha cabeça nestes dias. “Se o Estado cede, o Estado acaba...” Eis as palavras de um ex-operário, ex-líder sindical, ex-grevista (de fome), hoje Presidente “republicano”. Com certa curiosidade antropológico-cultural, mas não sem tristeza, fico meditando sobre esta frase. Um homem comum, inclusive bastante inteligente, sem saber (!) bebeu as águas mais cristalinas da ideologia do Estado, digna dos jacobinos de Floriano Peixoto e dos positivistas que, nos mais surpreendentes disfarces, tomaram conta da República desde seus alvores. O Estado-Deus.

O Estado não está aí para si mesmo. Está aí para servir ao bem comum, o que significa, em última instância, ao bem de cada um na complexa constelação de sobrevivência e transcendência, pragmatismo e simbolismo, luta pela própria vida e doação ao próximo. A maioria dos “homens de Estado” agem, talvez inconscientemente, em função da auto-conservação da instituição que os emprega e que eles empregam, assim como o clericalismo nas instituições religiosas. “Se a instituição cede, acaba”. E não será que ela deve continuamente “acabar” um pouco, rever suas posições firmadas, porque a vida muda? Dizer que o Estado não pode ceder, que não se deve sacrificar a maioria pela veleidade de um só - um frei bispo fazendo greve de fome ... “melhor sacrificar um só do que povo todo”, quem foi que disse? - nada tem a ver com verdadeira arte de governo. Verdadeira arte de governo é mostrar, na devida alçada, a Assembléia Legislativa, que um projeto de importância nacional está tecnicamente certo, politicamente viável, financeiramente seguro e limpo e outras coisas mais. Assim, o Estado serve, não impõe. Mas tal conceito de governo exige uma visão mais ampla, verdadeiramente humanista, que coloque o ser humano e seu ambiente vital acima do meio instrumental que é a instituição chamada Estado.

E aí está o ponto que mais me entristece. Não acho a sociedade brasileira muito alvissareira. A sociedade, digo. Não estou falando dos brasileiros individualmente, que são iguais a todos os filhos e filhas de Adão e Eva, mas das instituições nacionais e das tradições político-culturais. Muitas vezes fico pensando qual seria, entre os atuais caciques, o líder político consciente e disposto a adotar tal humanismo político, promovendo a reforma política e priorizando a competente participação do povo, sustentada por uma política de educação e formação humana digna desse nome.

Será que devo pedir isso a Papai Noel?


Johan Konings - Biblista e professor na Faculdade de Teologia (FAJE) de Belo Horizonte/MG.

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